Parecia um episódio isolado: uma tucana arrancou o dedo de uma petelha com uma dentada no Rio de Janeiro. Mas graças às enormes e intumescidas células cinzentas da mais brilhante mente investigativa da Galáxia (Plutão incluído), o Comissário Micalba
(foto), mais uma conspiração foi desmascarada: longe de ser a agente de um evento aleatório, a Canibal do Leblon apenas iniciou uma estratégia mercadológica destinada a garantir de uma vez por todas a eleição do Alckmin. O cérebro por trás de tudo é o conhecido
gourmet, personalidade internacional, gênio da psiquiatria e psicopata assassino Hannibal Lecter, recentemente cedido pelo FBI ao PSDB para coordenar a campanha tucana.
O Comissário Micalba revela segredos da investigação:
"Achei superlativamente suspeito o fato, e enquanto colocava minha equipe na rua em busca de dados mais concretos, formulei algumas teorias que infelizmente se revelaram excessivamente simplistas:
1) A Petelha na verdade se automutilou num processo de identificação com o seu Líder Supremo, e depois pôs a culpa em outra pessoa - comportamento normal num petista.
2) A Tucana arrancou o dedo da Petelha na esperança de que quando se essa se parecesse mais com seu Líder Supremo, ela finalmente compreendesse o significado das metáforas abiloladas dele e tivesse um
insight - e então abandonasse tudo em favor da capricultura ou outra atividade mais relevante.
3) A Tucana arrancou o dedo da Petelha num ato de legítima defesa antecipada - era menos uma extremidade pontuda que pudesse ser introduzida num orifício particularmente sensível da Classe Média no caso de um segundo mandado do Líder Supremo.
Enquanto isso meus agentes de campo voltavam com informações esparsas sobre um misterioso personagem norte-americano, o que inicialmente me confundiu - Hannibal Lecter é na verdade lituano. Mas a informação partiu do Detetive Manoel, e ao contrário da PF eu acredito que as mulheres são mais capazes - e coloquei as minhas Cachopas na pista. Logo a Agente Ernestina voltou com a informação completa, mesmo tendo arriscado a sua integridade física (o Lecter tentou devorar o lindo nariz de batatinha da Ernestina como aperitivo): o PSDB tinha contratado o Hannibal Lecter como marqueteiro no final da campanha.
Com a sua costumeira educação o charmoso psicopata
(foto) concordou em encontrar-se comigo, mas como não sou nenhum néscio escolhi um lugar seguro: um excelente restaurante, já que de estômago satisfeito o gajo é bem mais tranquilo. Sendo eu fiel às minhas origens, foi no Antiquariu's - entre o Porto
extra-dry do aperitivo e o
tawny da sobremesa, passando pela santola da entrada e os rojões à Alentejana regados a um Pêra Manca do prato principal que Lecter revelou seus segredos, e depois de devidamente vertido para o Português nosso diálogo ficou assim:
- O que o trouxe até aqui?
- Um convite ao mesmo tempo cordial e desesperado: com o Lula com 60% contra 40% do Alckmin, a única solução eficiente deve ser ao mesmo tempo radical e inovadora. Um mero Duda não basta, nem dois são suficientes. Foi assim que Mr. FHC lembrou-se do meu nome.
- FHC?
- Um cavalheiro encantador: fala três ou quatro idiomas fluentemente, ligeiramente marinado em bons vinhos franceses. Adoraria jantar com ele.
- E qual foi a sua idéia salvadora?
- Simplícissima, e nisto reside o seu charme. Se os 40% dos eleitores do Alckmin comerem um Petelho cada um antes das eleições, os 20% restantes corresponderão depois de refeita a percentagem a 33% do eleitorado - e a vitória de Alckmin estará garantida. Além do mais, outros problemas do país estarão resolvidos de quebra: Previdência Social, INSS, Seguro Desemprego, segurança, moradia e, principalmente, alimentação. Se cada Tucano doar as porções menos atraentes do seu Petelho a outro Petelho carente, ninguém mais passará fome.
- Não seria mais fácil você comer só o Lula e acabar com isso de uma vez por todas?
Lecter fez cara de desgosto:
- Carne flambada é bom, um
civet tem o seu lugar, um
coq au vin também. Mas afogada em uísque e cachaça é intragável. Não, obrigado.
- Você não acha a sua proposta um tanto... extrema? Talvez pouco ética?
- De forma alguma. Os Petelhos não vivem falando em Fome Zero? É a hora deles darem a contribuição final: você escolhe um Petelho qualquer, de preferência uma fêmea suculenta, e diz baixinho na orelha dele: que tal uma inserção social
radical? Depois é só limpar bem a carcaça. Além disso, estarei contribuindo com as melhores tradições da culinária brasileira.
- Como?
- A maioria dos eleitores do Lula está no Norte e Nordeste. Mesmo em Minas Gerais o grosso está do Triângulo Mineiro para cima. E pelo que sei do seu país adotivo as especialidades do Norte e Nordeste são coisas fortes, apimentadas e gosmentas, próprias para um estômago abrutalhado: Tucupi ao Tacacá, Sarapatel de Xinxim, Buchada de Bode, coisas assim. Por outro lado, Paul Bocuse considerou a cozinha do Sul de Minas a melhor do Brasil, os gaúchos são meio bárbaros mas sabem o ponto exato da carne e fazem alguns bons vinhos, os catarinenses sabem defumar bem um
kassler e fazer umas salsichas bem decentes. E os paranaenses podem fazer Barreado dos ossos duros de roer.
- E você acha que vai funcionar?
Lecter pareceu hesitar:
- Agora não sei. Mesmo com meu
workshop e as minhas instruções o máximo que a garota conseguiu foi comer a ponta do dedo da outra. Mesmo seguindo os meus mandamentos à risca.
- Sabe qual foi o problema, Dr. Lecter?
- Pode me chamar de Hannibal.
- OK, Hannibal. Sabe qual foi?
- ...?
- Seu tempo de Brasil é menor do que o meu, e certas coisas passaram desapercebidas. Seu plano todo se baseia na noção de ética dos petistas, certo? Pelos seus planos é a ética deles que faz com que quem acredita no Fome Zero aceite ser imolado sem resistir?
- Sim. E daí?
- E daí que Petelho desconhece completamente o conceito de Ética. Menos a Madrileña Chutaí, que finge um pouquinho.
-
Oh, shit.Caso resolvido. Mas tive pena do gajo".